sexta-feira, 24 de abril de 2009

Vladimir Horowitz, gravadora: Deustche Gramophon, NY 24 - 30 de Abril de 1985.

Horowitz teve mais reaparições do que Lúcifer. A cada década os demônios tomavam conta dele, mantendo-o afastado, sob medicamentos ou hospitalizado. Maníaco depressivo e desajeitadamente gay, ele era uma síntese do pianista maluco: usava gravata-borboleta, comia apenas peixe cozido e só dava concertos às 16:30. Era o mais natural dos artistas, abençoado com um toque que desafiava a gravidade e uma habilidade para estender as notas muito além do poder dos pedais. Quem o ouvisse, jamais esqueceria. Natan Milstein, seu amigo de infância, achava que ele nunca teve consciência do quão extraordinário era. No palco ele parecia mistificado pela tempestade de aplausos.Sua última reaparição, aos 82 anos, foi filmada em sua própria sala de estar, pelos irmãos Maysles. Espalhou-se a notícia de que ele estava em ótima forma. Seu agente chamou a CBS e a RCA e apresentou uma proposta. Procuraram Jack Pfeiffer, que trabalhara com Horowitz desde o início da carreira. As sessões se estenderam por seis tardes e noites, mas Vlad pareceu descansado o tempo todo. Nenhum pianista jamais tocou a transcrição de Busoni para um coral de Bach tão lentamente, nota por nota, revelando sua carapaça gigante. Ninguém, nem mesmo Horowitz, havia antes carregado o Prelúdio em Sol# menor de Rachmaninov de tão melancólicos presságios. Mozart e Chopin são tratados como se ainda estivessem vivos. Scriabin é tocado com o benefício do conhecimento pessoal e da grande afeição. Quando os produtores apontaram uma nota errada na gravação, ele disse: "Eu não quero a perfeição. Eu não sou Heifetz. Sou Horowitz. Este foi o ponto mais próximo a que este singular pianista chegou da autocaracterização artística.

Dinu Lipati - Chopin - valsas - EMI Estudios da radio Genebra Junho de 1950.

O pianista romeno Dinu lipati, morto aos 33 anos, fez suas poucas e preciosas gravações enquanto sofria de leucemia e procurava desesperadamente novos meios de cura. Apesar disso em suas execuções não há nada que sugira o drama pessoal. Lipati estudou com o iconoclasta Alfred Cortot, que muito fez para impulsionar a carreira do aluno. Sua articulação nítida e graciosa subverte a imagem do próprio Chopin como um mórbido melancólico, em breve passagem por esse mundo. Há algo de diabólico na arte de Lipati, uma abordagem quase improvisatória em parte derivada de Cortot, em parte por sua paixão em tocar jazz com os amigos.De compleição robusta e família rica, Lipati viveu no final da década de 30 em Paris, mas depois chegou a passar fome na Suíça, com sua esposa. O conservatório de Genebra acabou dando-lhe ume emprego, e a EMI, um contrato de gravação. As primeiras sessões em Londres foram entusiasticamente recebidas, e já se planejava uma turnê pelos EUA quando o câncer apareceu. A descoberta da cortisona deu-lhe uma ilusão da regressão da doênça, no verão de 1950, e o pessoal da EMI correu para Genebra para gravar as valsas de Chopin. A energia e o otimismo de Lipati tornaram até mesmo as mais sombrias valsas em tonalidades menores em peças cheias de brilho e agitação.
A sequência de valsas em Si menor, Mi menor e Lá menor, no meio da série, surge em suas mãos como um caleidoscópio de estados de alma sutilmente alternantes, dramáticos e não resolvidos, tal como numa peça de Tchekov.Depois desta gravação, Lipati deu um concerto em Lucerna e um recital solo em Besançon, mas o alívio não durou muito, e ele partiria antes do Natal.Os poucos discos que deixou - concertos de Mozart e de Schumann, com Karajan, um recital de Bach, Mozart, Schubert e Chopin, as valsas e noturnos de Chopin - revelam um pianista de Gênio expressivo que, ainda assim, deixou a música falar por sí mesma. Embora Rubinstein e Horowitz tenham sido mais celebrados como intérpretes de Chopin, Lipati foi o pianista de Chopin dos pianistas.