O concerto mais popular do século XX, depois do Concerto nº2 de Rachmaninov, foi escrito por um cego, sob a tirania fascista e ambientado no esplendor cortesão e escapista de um jardim do séc. XIX da dinastia Bourbon. O primeiro e o último movimento não são grande coisa, mas o Adágio central desfalece de desejos inatingíveis. Após quatro acordes no violão, o corne inglês inicia seu maior solo depois da Sinfonia do Novo Mundo, de Dvórak; muito da magia que se segue está no diálogo entre esses dois instrumentos. O tema apaixonado de Rodrigo inspirou Miles Davis em "Sketches of Spain", e foi adaptado às palavras "mon amour" pelo cantor francês Richard Anthony. Sua atração, disse o compositor, tem origem na "síntese entre o clássico e o popular, tanto em forma como em emoção." Contudo não foi tanto a unidade, mas as sugestões de fragilidade e fragmentação que deram ao tema seu apelo universal.Rodrigo, cego em conseqüencia da difteria aos três anos de idade, estava vivendo na pobreza e sentia muito medo (sua esposa era estrangeira e judia) em 1940, quando escreveu Aranjuez para o instrumento nacional, o violão, tornando-se um ícone instantaneamente. Pianista capaz, ele negou sequer ter tentado um dia tocar violão, e não ficou ofendido quando o grande Andrés Segovia rejeitou o concerto, alegando que várias passagens estavam escritas na tonalidade errada e parte da música fazia seu violão soar como um bandolim. (Rodrigo compensou-o mais tarde com uma música mais gratificante: "Fantasia para un Gentilhombre"
Pela necessidade de se ter uma estrela espanhola, o concerto ficou disponível para apropriações. O inglês Julian Bream o estreou em disco com uma interpretação que exagerou no sentimentalismo. Mas o homem que pôs fogo nas lojas de disco foi o jovem australiano John Williams, que havia recebido as bençãos de Segovia a caminho de Londres e fez seu disco de estréia sob os auspícios da afinada sobrinha de Fred Gaisberg, Isabella Wallich. Williams, contratado pela CBS, era a própria imagem dos anos 60, com seus longos cabelos escuros e camisa folgada. O selo, por razões obscuras, colocou-o junto à solene Orquestra da Filadélfia, dirigida por Eugene Ormandy, que nunca foi visto sem terno e gravata e sabia tudo a respeito de clássicos populares, por ter trabalhado com Rachmaninov. Seja por acidente ou por desígnio, a dupla produziu um sucesso duradouro, uma atração de opostos.
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