domingo, 17 de maio de 2009

Verdi: Aída - Renata Tebaldi, Mario del Monaco, Ebe Stignani - Coro e Orquestra da Academia de Santa Cecília, Alberto Erede

Renata Tebaldi foi o antídoto da natureza contra Maria Callas. Contida onde a cantora grega se excedia em emoção e de voz pura nos trechos em que Callas estrilava, ela era adorada pelos conhecedores de ópera, mas nunca gozou da mesma celebridade. Estava com trinta anos quando fez essa gravação. Tebaldi estreou nos Estados Unidos como Aída em São Francisco, em 1950, mas foi somente após cinco anos que se tornou presença constante no Metropolitan de NY, a jóia da coroa após Rudolf Bing ter demitido sua tempestuosa rival. Ao passo que Callas era estrela da mídia, Tebaldi era a rainha do palco, a serena ditadora da ilusão.
Um ano mais velha qua Callas, ela nunca se casou nem dormiu com milionários, chegava pontualmente aos ensaios e cantava com prazer. Sua única rebeldia era recusar-se a cantar óperas não-italianas e a comer comida estrangeira, por achar incultas as outras línguas e culinárias.
Callas fazia manchetes sobre a rivalidade entre elas, perguntando aos jornalistas se estes não preferiam seu champanhe à Coca-Cola do Met. Tebaldi respondia que achava o champanhe uma bebida um tanto amarga. Elas estavam no cume da ópera. Ao passo que Callas reinava no Scala de Milão, Tebaldi dominava Florença e Roma. Callas ocupava o Covent Garden, que Tebaldi boicotava por ser "uma casa de Callas." Para além da hostilidade, havia um respeito mútuo. Esta Aída foi o trampolim de Tebaldi, um ano antes do aparecimento de Callas. Foi também a primeira gravação de ópera a soar de modo realista. Mesmo limitada pelo som mono, a sala da Academia Santa Cecília deu uma dimensão cavernosa ao deserto egípcio de Verdi e uma asfixiante claustrofobia ao sepultamento de Radamés. Apesar dos quarenta graus de temperatura, sem o ar-condicionado, Tebaldi canta sem esforço, destacando-se, mesmo quando acompanhada por grandes coros, e alternando para sussurros. Ela cantava mais suave que qualquer spinto* da época, e, embora o corpulento Mario del Monaco não fosse o parceiro ideal, o regente, Alberto Erede, foi o melhor balanceador das vozes. Muitos dizem prefrir a versão stéreo de Tebaldi para a Aída com Bergonzi e Karajan, mas esta interpretação tem as virtudes do frescor e da ousadia. Nada fica para trás, e Stignani, que freqüentemente era apenas um realce para Callas, encontra na luminosa Tebaldi uma personalidade mais confiável. Meio século depois, ainda não havia nenhuma Aída (exceto a nova versão com karajan) que se igualasse a essa.

*Termo usado para uma voz lírica, geralmente soprano ou tenor, capaz de soar possante ou incisiva nos clímaces dramáticos.

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