Com as exceções de Bruckner e Scriabin, Bernstein gravou praticamente todos os grandes sinfonistas clássicos contemporâneos, alguns deles duas vezes, bem como qualquer compositor americano digno de nota, vivo ou morto. Expansivo no pódio, saltando mais que qualquer outro maestro fora das Olimpíadas, os entusiasmos de Bernstein foram atenuados em disco pelo som excessivamente brilhante dos seus dias de CBS, ao passo que a sua segunda chegada, pela DG, foi quase sempre irregular em andamento e expressão, com as linhas argumentativas curvadas ao capricho da sua fantasia do momento. Em termos de clareza e precisão em gravação, Bernstein foi freqüentemente superado por Karajan, Haitink e Solti, seus rivais europeus.
Na música americana, contudo, ele foi indiscutivelmente um líder. Nenhum outro maestro fez mais para elucidar o tortuoso gênio de Charles Ives, a quem ele chamava de "Grandma Moses" da música*, os timbres vívidos de Aaron Copland, as paisagens de Norman Rockwell musicadas por Roy Harris, as consolações de Samuel Barber - acima de tudo, o suingue de George Gershwin, com quem tinha grande afinidade. A música sinfônica da qual foi autor sofreu o impacto do seu sucesso como regente e como compositor da Broadway. Os críticos depreciaram duas das suas três sinfonias, aceitando apenas "Age of Anxiety" como obra válida, e a Missa que ele escreveu para os Kennedy foi imediatamente desqualificada, com certa razão, por sua embaraçosa intemperança. Eclético e por vezes volúvel, Bernstein não conseguia manter a concentração necessária para sustentar uma obra sinfônica importante que não contasse com distrações de palco e exibicionismo.
São duas as excessões a essa regra: a platônica "Serenata para Violino e Orquestra", patrocinada por Isaac Stern, e os "Salmos de Chichester", encomendados por um pároco progressista de uma catedral inglesa. Bernstein assumiu o desafio com uma ingenuidade brincalhona. Ele compôs versos a partir de três salmos em hebraico bíblico, uma língua mais antiga que o cristianismo e jamais cantada em recintos consagrados anglicanos. Os textos extravasam exaltação lírica e amor a um só Deus - palavras que proporcionam júbilo quando cantadas ou ouvidas, com um delicioso solo para menino soprano na seção central, acompanhado por uma harpa davidiana e ritmos cruzados percussivos. Bernstein terminou o trabalho em Maio de 1965, fez a estréia na Inglaterra em Julho e levou-a ao estúdio de gravação assim que voltou aos EUA, de modo que os LPs estavam nas lojas antes do Natal. "Como é bom e agradável ver os irmãos vivendo juntos em harmonia", é a mensagem ecumênica nas entrelinhas.
*Anna Mary Moses (1860-1961), mais conhecida como "Grandma Moses" foi uma consagrada pintora americana, muito citada como exemplo de pessoa que fez sucesso em uma carreira iniciada tardiamente.
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