Ninguém que tenha visto Tennstedt reger se esquecerá da incerteza prévia. A orquestra sentava-se em posição, meio que esperando o cancelamento, enquanto os minutos se passavam após o horário agendado. Então, entrando rapidamente no palco, quase tropeçando, aquela figura periclitante subia ao pódio e, com o mais inocente dos sorrisos, dava início a uma execução como nenhuma outra, antes ou depois. A essência de sua arte era a espontaneidade, o que era um anátema para o ethos perfeccionista do estúdio de gravação.
Tennstedt era um regente natural, não-intelectual, que absorveu os princípios de regência de seu pai, violinista principal na pequena cidade de Halle na ex-Alemanha Oriental, e iniciou-se no instrumento, até que um ferimento na mão acabou com sua carreira. Perseguido pelos comunistas, ele fugiu para a Alemanha Ocidental, onde viveu em provinciana obscuridade, até que uma série de coincidências o levasse a uma explosiva estréia americana em Boston, depois da qual o mundo e os selos de gravação ficaram a seus pés. Tennstedt respondeu com um sério colapso nervoso. Encontrou, porém, apoio na música de Gustav Mahler, que se tornou o leitmotiv da sua ansiosa vida. O Mahler de Tennstedt era inteiramente intuitivo, ignorante a respeito de teoria crítica e insuflado pela experiência pessoal. A Sexta, disse-me ele certa vez, antecipou em seus compassos iniciais o ruído das botas dos nazistas, e seu triste finale retrata a impotência do indivíduo em face da tirania do Estado. Estes insigths foram subliminarmente integrados às execuções, sem gestos explícitos ou explanações nos ensaios. Os concertos de Tennstedt eram enriquecidos tanto pelo impulso momentâneo como pela reflexão prévia.
Sua abordagem de Mahler era narrativa, um evento sucedendo outro, implacavelmente, até a pressão se tornar insuportável e a catarse ter lugar. Na Sexta, ele equilibra o terror do primeiro movimento com passagens de profunda compaixão, acelerando o passo até o frenesi do Scherzo, que leva a um Andante de incomparável suavidade. No desolado finale (não há nada mais desolador em todo o repertório sinfônico), ele permite algumas fendas de consolo. O público presente a um concerto da BBC Proms ficou imóvel durante os noventa minutos da Sexta, petrificado pela intensidade da interpretação. A gravação em estúdio de 1983 (EMI) não expõe o alto risco que Tennstedt cortejava, e foi excessivamente maquiada pela edição. Esta execução ao vivo, feita após o retorno do maestro de um tratamento para um câncer na garganta, é menos selvagem que o usual mas aprofunda-se com uma irresistível finalidade. O câncer e a insegurança levaram a arte de Tennstedt a um final balbuciante e trágico.
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