terça-feira, 4 de agosto de 2009

Purcell:Dido e Enéas - Le concert d'astrée - Emmanuelle Haim - EMI / Virgin - Metz, Março de 2003.

A indústria fonográfica recusou-se a reconhecer as mulheres regentes. Poucas delas gravaram um ou dois discos, mas nenhuma teve contrato de gravação. Não parecia ter havido qualquer mudança sob esse aspecto no momento em que a indústria iniciava sua queda livre. Mas, do nada, surgiram duas mulheres, de formações diferentes, que quebraram os moldes antigos. Marin Aslop, uma aluna de Leonard Bernstein, gravou uma enxurrada de música americana para o selo Naxos. O sucesso foi tamanho que ela ganhou um ciclo de Brahms. Emmanuelle Haim, tecladista francesa, se encarregou de "Rodelinda", de Handel, em Glyndebourne, ganhando um contrato com a EMI Virgin.
Como cravista de William Christie, Haim havia chamado a atenção de Simon Rattle e Abbado. Ela formou seu próprio conjunto - o Concert d'Astrée e logo foi procurada como regente convidada por orquestras do primeiro time. Sem ficar refém de nenhuma doutrina "de época", ela escalou o elenco para a obra-prima de Purcell com grandes vozes - Susan Graham e Ian Bostridge - e convenceu o mestre do coro de Rattle em Berlim, Simon Halsey, a dirigir seu grupo vocal, usando instrumentos de época no fosso e com ela própria regendo, ao cravo.
Apesar do risco de dar espaço à exuberância dos grandes nomes, a execução, arrebatada e liricamente pura, foi uma colaboração entre iguais. Graham soa completamente à vontade no barroco e Bostridge irradia preciosidade através de sua virilidade muscular. Não há carência de competição de divas em disco, de Janet Baker, Maria Erwing, Jessie (acredite se quiser) Norman, Emma Kirkby e Kirsten Flagstad, mas nesta versão Graham é a primeira entre iguais, e esta é a sua maior virtude. A emoção do momento em que Dido está "deitada na terra" é avassaladora, por ser puramente aural, pois sua morte não é vista. Seria a última ocasião em que uma ópera gravada triunfaria sobre todas as encenações.

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